8.6.07


Brigar com ele é como sentir cansaço no corpo depois de um dia inteiro se gastando numa rotina inútil. Bom é chegar em casa depois de. Tomar um banho. Colocar a camisa azul favorita – aquela que está rasgada no ombro esquerdo. A calça cinza velha de moletom.

Aquecer o corpo num lençol delicioso. Cheiro de sol. Fechar os olhos. Não deter-se em emboscadas feitas por palavras. Os pensamentos demasiadamente cansados para.

Enroscar-se. Encontrar o melhor lugar. Aconchegar-se num abraço perfeito. Desencontrar-se de si mesmo. Deixar de existir num sonho...

Reconciliar-me com ele... Coisa que não se pode dizer. Sentir. Um regozijo que vai tomando o corpo. Escala preguiçosamente cada músculo e no topo transforma-se em sorriso.

Vê-lo dormir. Uma espécie de ritual que eu adquiri. Os minutos vão passando e eu catalogando...
Quero ler cada linha - sobretudo, aquelas que eu mesma escrevi.




Palavras por Ana Luisa Lima.
Imagem por Marcos Vasconcelos.

2.6.07


Dual


Preciso reconhecer minha completa falta de talento para amar, para o amor. Simplesmente, os amores não duram. Não vivem para finais felizes – nem trágicos. Não há finais. Os amores morrem cedo - quando já é tarde demais para. Amores boêmios. Eu penso em morrer junto... Mas. Até isto não sei fazer. Os poetas do Mal do Século ensinaram que para morrer tem que saber como: tem que se morrer bem antes de. E finalmente sangrar a última gota.

Como não admito que se possam morrer melhor, decidi: se tiver de morrer, morrerei de alegria. Não morro melhor, mas morro incongruente. Dê-me um novo amor que eu já aprendi.

É preciso fazer tristeza para amar feliz.



Palavras por Ana Luisa Lima.
Imagem por Marcos Vasconcelos.

16.4.07




Figura


Escolhemos um lugar escondido, debaixo de uma árvore frondosa à beira do rio. Cavamos com nossas próprias mãos. Quebramos as unhas. Enterramos. Sujos e cansados, deitamo-nos em cima. Um jazigo sem lápide - para um amor enterrado vivo. Sangramos.

Deitados e de mãos dadas. Esperamos. Imaginamos o tempo necessário para aquela morte (in)adequada; a areia negra entrando pela garganta. O amor deveria morrer sufocado, em agonia. Nós fingimos calma - frieza de assassinos.

Ajudamo-nos a nos levantar com gentileza - sem coragem de olhar: olhos-nos-olhos. Tomamos nossos caminhos. Antagônicos.

Por culpa ou solidão, eu ainda volto ao lugar. Choro sem saber se o amor morreu, ou se alguém descobriu em tempo nossa loucura... Virei refém.

Visito o jazigo com flores – jasmins – e esperança inútil. Há muito que não passo nem perto de sua janela... Pra quê?



Palavras por Ana Luisa Lima.
Imagem de Marcos Vasconcelos.

21.3.07


A velha calça desbotada ou coisa assim
Ou, sobre A.

Sei que não deveria, mas eu ainda sinto o seu cheiro no travesseiro. E é tão doído perceber que o calor da minha cama não é o mesmo: há uma metade fria: o lado esquerdo – também no meu peito.

Não podia imaginar que sua ausência me faria perder os sentidos. E é tão sem sentido esse me perder. Foram muitos os [não] amores que arquitetei. Construí tantos casamentos sombrios: cada casa um mausoléu.

E eu juro que, diariamente, engendro uma tentativa: ensaio uma nova despedida para não mais doer. Mas, toda manhã, por debaixo da porta, vão me acordar: o aroma do café e a música do Roberto.

Sento à mesa com saudades de você e nossos dramas. Tento inutilmente ter poderes de cigana e certificar-me da sua volta no fundo da minha xícara.

E não há mágica que possa.



Palavras por Ana Luisa Lima.
Imagem por Marcos Vasconcelos.

19.3.07

Entremeio
a André.

Tem dias em que naquele momento de quase acordar penso estar em outra vida – aliás, a mesma vida que se por outras circunstâncias... Oportunidade de redenção. É quando não me pesam os nãos e as possibilidades estão todas ali, diante de mim. Naquele quase-dormir fluxos de sentimentos me tomam. As sensações retornam como se nada.

É como se tudo fosse como antes.

Essa semana, num desses instantes, revivi a presença de A. O meu corpo foi capaz de latejar de alegria, invadia-me mais uma sexta-feira – o dia em que trabalho, amigos, família e faculdade eram deixados para trás. Só trazíamos para o nosso encontro as saudades, amontoadas como cartas, de uma semana inteira.

Mas é acordar e ver que seus cabelos cacheados não têm cheiro, e daquele sorriso não me virá um beijo. É perceber que as coisas hoje já não sufocam de desespero. E o meu destempero é essa ausência de dor no peito – apesar da ferida que ainda sangra.

No momento de quase acordar, em que penso estar em outra vida, os relógios fingem estancar: o tempo e o corte. E por poucos segundos... A. aqui dentro - em mim. Cada vez menos...


Palavras por Ana Luisa Lima.
Imagem por Marcos Vasconcelos.

A pergunta mais acertada não é: o quê? Mas: por quê?

1000 : 1 é a vontade de dar forma aos infinitos conteúdos vivenciados, pesquisados e discutidos por essa dupla de amigos - há pouco mais de seis anos -, talvez com mil palavras ditas por ela e uma imagem pensada por ele (ou vice-versa). Serão - sempre - dois textos (palavras e imagem) convergindo: assim como acontece na vida desses autores.

Ela: Ana Luisa Lima: estudante de Artes Plásticas e dando os primeiros passos como crítica de arte.

Ele: Marcos Vasconcelos: estudante de Design e apaixonado por fotografia.

E não esqueçam: tudo é uma tentativa de.

Boas leituras e sejam bem-vindos.